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O princípio da igualdade: um passo para o fim da violência política.

Tammy Fortunato – Membro Efetivo do IASC [1] 

 

A política é parte da organização de uma sociedade, estando presente desde os tempos mais remotos, sendo, muitas vezes, apresentada como forma de poder. A política está presente nas formas de governo, nas instituições de classe e, inclusive, na convivência diária entre as pessoas. O bom convívio gira em torno da política.

A Constituição da República do Brasil traz o princípio da igualdade entre homens e mulheres, garantido a todos os mesmos direitos e obrigações. No entanto, no meio ambiente político, principalmente quando envolve cargos políticos ou de poder, a igualdade deixa de ter o mesmo significado, não sendo muito receptivo às mulheres.

Aliás, lutar pela igualdade e pelo seu fiel cumprimento é a primeira batalha a ser vencida por uma mulher ao tentar ocupar um cargo político, um cargo de poder. Michele Bachelet, diz que: “Quando uma mulher entra na política, muda a mulher. Quando muitas entram, muda a política”. Eis aí mais uma das grandes batalhas femininas: mudar a política.

O ingresso de mais mulheres no meio ambiente político não é tarefa fácil e nunca foi. Houve um tempo, inclusive, em que mulheres sequer eram consideradas cidadãs, sem direito de votar e serem votadas, e eram vetadas de expressar a cidadania.

Exercer a cidadania é, manifestamente, fazer parte de uma sociedade livre, justa e igualitária, mas acima de tudo, é trabalhar para garantir que não haja desigualdade e hierarquia entre os gêneros quando se trata de cargos políticos de destaque ou de poder.

A realidade é um tanto diferente do que almeja a nossa Carta Maior, quando trata do princípio da igualdade, embora o Estado possua elementos que possam efetivamente trabalhar a igualdade, eliminando a discriminação, muitas vezes não o faz.

A busca pela igualdade real é ampla, no entanto, o meio ambiente político trata os iguais com desigualdade. Um exemplo é a lei 9.504/97[2], trazendo que cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% e o máximo de 70% para cada candidatura de cada sexo, o que demonstra que na política a disparidade é regra.

Mulheres não precisam de cotas, precisam de igualdade, de paridade, sendo esta definida por Coucelo[3], como sendo:

Um conceito e objetivo, através do qual se pretende reconhecer igual valor a pessoas de ambos os sexos, dar visibilidade à igual dignidade de homens e mulheres, renovar a organização social de modo a que mulheres e homens partilhem, de fato, direitos e responsabilidades, não sendo reduzidos a espaços e funções predeterminadas por hábitos e preconceitos, mas usufruindo de plena igualdade e liberdade a todos os níveis e em todas as esferas. A participação política das mulheres é, pois, crucial a uma democracia onde mulheres e homens se encontram representadas/os, detendo a mesma influência e força política, economia e social.

No Brasil, temos que 51% dos eleitores são mulheres, mas um número menor do que 10% ocupam cargos eletivos, demonstrando falta de representatividade, de igualdade[4].

O Brasil ocupa atualmente 132ª posição (entre 190 países), em relação ao número de mulheres que ocupam cargos no Senado e na Câmara de Deputados[5]. Dentre as 513 cadeiras na Câmara dos Deputados, apenas 86 são ocupadas por mulheres[6]. Números que preocupam.

Tanto preocupam, que o Comitê CEDAW[7], que tem a responsabilidade de garantir a aplicação da Convenção para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, traz no artigo 7º a seguinte redação:

Os Estados-parte tomarão todas as medidas apropriadas para eliminar a discriminação contra a mulher na vida política e pública do país e, em particular, garantirão, em igualdade de condições com os homens, o direito a:

  1. a) Votar em todas as eleições e referendos públicos e ser elegível para todos os órgãos cujos membros sejam objeto de eleições públicas;
  2. b) Participar na formulação de políticas governamentais e na execução destas, e ocupar cargos públicos e exercer todas as funções públicas em todos os planos governamentais;
  3. c) Participar em organizações e associações não governamentais que se ocupem da vida e política do país

A participação feminina em cargos políticos ainda é muito pequena, assim como a participação do Estado brasileiro para erradicar as diferenças, demonstrando que a igualdade enquanto direito fundamental ainda não é de fato observada, trazendo um perigo para a efetivação da democracia.

Mulheres não podem ser consideradas observadoras do cenário político, são partes integrantes do sistema, buscando a efetiva igualdade e, como diz Bertha Lutz: “Recusar à mulher a igualdade de direitos em virtude do sexo é denegar justiça a metade da população”. Não só denegar justiça, mas denegar direitos arduamente conquistados.

A desigualdade na política aponta não só um perigo para a democracia, mas, demonstra uma outra forma de violência sofrida pelas mulheres: a violência política.

A lei 14.192[8] de 2021, conceitua a violência política contra a mulher como: “toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar ou restringir os direitos políticos da mulher” complementando em seu parágrafo único: “Constituem igualmente atos de violência política contra a mulher qualquer distinção, exclusão ou restrição no reconhecimento, gozo ou exercício de seus direitos e de suas liberdades políticas fundamentais, em virtude do sexo”.

A lei tem como objetivo, estabelecer normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher, assegurando uma participação efetiva e livre de discriminações por razão do gênero, raça, cor ou etnia[9].

O direito político, assim como, a igualdade entre os gêneros, é uma garantia prevista na Constituição da República, não se aceitando que novamente mulheres tenham seus direitos impedidos ou restringidos.

É preciso que se construa um meio ambiente político livre de violência contra as mulheres, com observância ao princípio da igualdade e, a real aplicação da paridade para a garantia da democracia.

A violência política contra as mulheres é manifesta, é algo que ainda persiste e precisa ser prevenida, reprimida e combatida. É uma violação não só aos direitos humanos, mas uma grave violação aos princípios fundamentais previstos na Constituição da República.

Cabe ao Estado brasileiro fomentar políticas públicas objetivando a inclusão de mais mulheres no cenário político, corroborando assim, para a igualdade entre os gêneros e garantindo o fiel papel da democracia, que busca a participação do maior número de cidadãos para a tomada de decisões políticas.

[1] Tammy Fortunato, advogada e professora. Pós graduada em Direito e Negócios Internacionais pela Universidade Federal de Santa Catarina. Mestranda em Ciência Jurídicas e Políticas na Universidade Portucalense/Portugal.

[2] BRASIL. Lei nº 9.504 de 30 de setembro de 1997 [online]. Brasília. Presidência da República. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9504.htm. Art. 10. Acesso em 03 de Nov. de 2021.

[3] Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres. [Em linha]. Disponível em: https://plataformamulheres.org.pt/artigos/temas/paridade-e-participacao-politica/. Acesso 03 Nov 2021.

[4] Bonneti, Alinne e Souza, Ângela Maria Freire de Lima (org.). Gênero, mulheres e feminismos. Salvador: EDUFBA: NEIM, 2011. ISBN 978-85-232-0851-6.

[5] Brasil. Senado Federal. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/07/13/incentivos-a-participacao-das-mulheres-na-politica-estao-na-pauta-desta-quarta-feira. Acesso em 03 de Nov de 2021.

[6]Brasil. Câmara dos Deputados. Disponível em: https://www.camara.leg.br/deputados/quem-sao/resultado?search=&partido=&uf=&legislatura=56&sexo=F. Acesso em 22 de Jul. 2021.

[6]https://www.pordata.pt/Portugal/Mandatos+nas+elei%C3%A7%C3%B5es+para+a+Assembleia+da+Rep%C3%BAblica+deputados+do+sexo+feminino+em+percentagem+do+total++por+partido+pol%C3%ADtico-2261. Acesso em 21 de Jul.2021.

[6] Portal G1. Disponível em:  https://g1.globo.com/mundo/noticia/2020/03/06/mulheres-ocupam-25-das-vagas-em-parlamentos-no-mundo-aponta-estudo.ghtml. Acesso em 03 de Nov. 2021.

[7] Cedaw – Convenção sobre eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher. [online]. Disponível em https://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2013/03/convencao_cedaw.pdf. Acesso em 03 Nov 2021.

[8] Brasil. Lei nº 14.192 de 4 de agosto de 2021. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14192.htm. Acesso em 04 de Nov de 2021.

[9] Brasil.Lei 4.737 de 15 de julho de 1965. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L4737.htm Art. 243, X. Acesso em 04 de novembro de 2021.

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