iascsecretaria@gmail.com
+55 (48) 3039-0059

Notícias

Artigos & Publicações periódicas

É nula a execução quando o credor fiduciário reduz unilateralmente o valor do imóvel, a fim de abater montante menor da dívida e cobrar em juízo o valor remanescente, decidem Justiça Federal de Santa Catarina e TRF da 4ª Região.

Por Hélio Ricardo Diniz Krebs – Presidente da Comissão de Direito Bancário do IASC.

Ao analisar embargos à execução e pedido de tutela provisória em ação cautelar antecedente para suspensão de leilão extrajudicial de bens imóveis, a Justiça Federal de Santa Catarina considerou ilegal a conduta de instituição financeira que reduziu unilateralmente o valor contratual de avaliação do imóvel alienado fiduciariamente em garantia, com a finalidade de abater montante menor da dívida e ajuizar ação de execução para cobrar o saldo remanescente.

No caso em comento, tratava-se de uma dívida representada por Cédula de Crédito Bancário, no valor de R$ 3.700.000,00 (três milhões e setecentos mil reais), que foi parcialmente garantida por alienação fiduciária de imóveis de propriedade do devedor fiduciante e que foram avaliados contratualmente, em R$ 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil reais). A dívida vinha sendo adimplida regularmente, até que o saldo devedor foi reduzido para aproximadamente R$ 2.000.000,00, quando então o devedor deixou de adimplir as parcelas.

A instituição financeira (credor fiduciário), então, reduziu unilateralmente o valor de avaliação do imóvel para R$ 1.900.000,00 e, após atualizar o valor da dívida, ajuizou ação de execução para cobrar um “suposto” saldo remanescente de aproximadamente R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), mesmo sem ter levado os imóveis previamente à leilão, tal como exige a Lei nº 9.514/97, o que só veio a ocorrer cerca de 1 ano e meio após o ajuizamento da execução.

Ocorre que, segundo os arts. 24, VI e 27, § 1º da Lei nº 9.514/97, o imóvel deve ser oferecido, em 1º leilão, pelo valor da avaliação prevista no contrato, observados eventuais critérios de atualização também previstos contratualmente, não cabendo ao credor fiduciário alterar unilateralmente referido valor.

Esse entendimento foi referendado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), ao julgar recurso de agravo de instrumento interposto pela empresa devedora fiduciante e seu sócio avalista, em que almejavam a exclusão de seus nomes dos cadastros de inadimplentes.

Ao reiterar os fundamentos da decisão de 1º grau e conceder o pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal (posteriormente, confirmado pelo órgão colegiado), o TRF4 consignou que, ao seguir a fórmula legal prevista nos arts. 24, VI e 27, § 1º da Lei nº 9.514/97, “[…] pressupõe-se na espécie ter havido prévia estipulação referendada por ambas as partes a respeito do quantum a ser considerado, na forma do contrato de mútuo.

Dessa forma, prevalece necessariamente para todos os efeitos a estimativa formalizada com respaldo do contrato e da lei. Qualquer ulterior valorização ou desvalorização para além do previsto e assentido, se havida, será apenas considerado sob perspectiva de mercado pelos lances dos arrematantes interessados em eventual alienação extrajudicial.

Tendo tudo isso em conta, constata-se que não há cabimento na atribuição agora pelo credor de valoração menor aos bens, nem sequer se junge o devedor à necessidade de renovar sua avaliação, visto que prevalente o valor pré-fixado no contrato para o bem conforme entregue, apenas submetido a atualização na restrita forma acordada no respectivo instrumento.

Dessa forma, na medida em que assenta no edital valores de avaliação e venda do bem inferiores respectivamente ao valor de avaliação contratual (baliza mínima para o primeiro leilão) e da dívida (baliza mínima para o segundo leilão, quando somada com demais despesas, tributos e encargos legais), a ré incorre em providência ilegal detrimentosa à quitação do mútuo pelo devedor”.

Posteriormente, conjuntamente com a sentença do processo que visava à suspensão e declaração de nulidade do edital de leilão dos imóveis, foi proferida sentença de procedência dos embargos à execução, a fim de extinguir a execução, sob o fundamento de que “o valor do imóvel para eventual leilão deve corresponder àquele constante no contrato que serve de título ao negócio fiduciário, nos termos do art. 24, inciso VI da Lei nº 9.514/97. Portanto, o valor da avaliação que deve ser considerado para fins de venda em leilão não é o preço de mercado. […]

A CEF não possui discricionariedade para avaliar os imóveis quando entender conveniente, em face de suposta defasagem, a fim de abater montante menor da dívida e cobrar em juízo valor maior remanescente.  

Diante da ilegalidade do procedimento de consolidação do imóvel em favor da CEF, é de se reconhecer que o valor objeto da execução em apenso carece de liquidez, procedendo, neste ponto, uma das causas de pedir veiculadas nos embargos à execução nº 50266635020184047200/SC. 

Acolhidos os embargos, com o reconhecimento da iliquidez da dívida objeto de cobrança na execução em apenso, deve ser ela extinta, restando prejudicada a análise das demais causas de pedir veiculadas nesta ação”.

Contra essa sentença, o credor fiduciário interpôs recurso de apelação, porém, desistiu em seguida, restando consolidada a extinção da execução.

Cabe ressaltar, no entanto, que, independentemente da redução unilateral do valor de avaliação, promovida ilegalmente pelo credor fiduciário, a execução em comento também se revela manifestamente nula, por outros fundamentos.

Isso porque, o § 5º do art. 27 da Lei nº 9.514/97 é claro no sentido de que, “Se, no segundo leilão, o maior lance oferecido não for igual ou superior ao valor referido no § 2º, considerar-se-á extinta a dívida e exonerado o credor da obrigação de que trata o § 4º”. Logo, ainda que os leilões do art. 27 da Lei nº 9.514/97 tivessem sido realizados, resta claro que o credor fiduciário não teria direito a executar qualquer saldo devedor (pois a dívida é considerada extinta após o 2º leilão), até mesmo porque o valor da dívida à época da intimação para purga da mora e da consolidação da propriedade era bem inferior ao valor de avaliação contratual do imóvel.

De todo modo, o fato é que tais leilões não ocorreram, o que torna inexigível a dívida apresentada pelo credor fiduciário na inicial da execução, uma vez que não se implementou a “condição” que, neste caso, seria a realização dos leilões, de modo que falta à execução o requisito previsto no art. 798, I, “c” do CPC.

Não obstante, caso tivessem ocorridos os leilões e, na remotíssima hipótese de se admitir que o credor fiduciário pudesse cobrar eventual saldo remanescente (o que violaria o § 5º do art. 27 da Lei nº 9.514/97), referida cobrança deveria se dar pela via da ação monitória e não da ação de execução, conforme dispõe a Súmula 384/STJ (“Cabe ação monitória para haver saldo remanescente oriundo de venda extrajudicial de bem alienado fiduciariamente em garantia”) que, embora tenha sido editada para regular o procedimento da cobrança de saldo remanescente após venda de bem “móvel” alienado fiduciariamente, aplicar-se-ia perfeitamente ao caso em comento.

*** As informações acima são extraídas dos processos ns. 5026663-50.2018.4.04.7200 e 5001110-30.2020.4.04.7200/SC.

#direitodoconsumidor #direitobancarioedoconsumidor #direitoempresarial #direitoimobiliarioextrajudicial #direitobancário #direitobancario #direitoprocessualcivil #processocivil #banco #bancos #alienacaofiduciaria #alienaçãofiduciária #direitoimobiliário #direitoimobiliario

 

Deixar uma Resposta