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A Advocacia em tempos de pandemia.

Por Gilberto Lopes Teixeira* – Membro Efetivo do IASC.

 

Garantir que cada indivíduo seja livre para fazer o que desejar inevitavelmente compromete a igualdade.

Yuval Noah Harari[1]

 

O trabalho dignifica o ser humano, liberta-o do ócio, proporciona, muitas vezes, a realização de sonhos, conquistas e o aperfeiçoamento da intelectualidade. O ofício profissional também permite que o indivíduo interaja com o próximo criando laços de amizade e cooperação, rompendo barreiras sociais, ideológicas, partidárias, geopolíticas, trazendo a satisfação, o fomento, o bem-estar e auxiliando no desenvolvimento da saúde física e mental.

A Advocacia, por seu turno – ofício indispensável à administração da Justiça, na efetividade da Cidadania e na construção e mantença da própria Democracia – tem sido bússola a guiar o homem ao longo dos tempos conturbados. Períodos de tensões, de regimes ditatoriais, de guerra e pós-guerra, de recessão, e, recentemente, em tempos de pandemias[2] (tais como a peste negra, tuberculose, varíola, cólera, gripe espanhola, tifo, febre amarela, sarampo, malária, dengue, HIV, H1N1 que já causaram estragos grandes à humanidade[3]) têm exigido da Advocacia um olhar mais atento e criterioso com ações céleres e efetivas na busca do bem estar coletivo.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou recentemente, em 11 de março de 2020, a epidemia da covid19, popularmente denominada coronavírus (Sars-Cov-2), como uma pandemia que passou a exigir dos Advogados não só a expertise e o conhecimento técnico próprio da profissão, mas também a inteligência emocional e a saúde psíquica em momento tão dramático e angustiante por que passa o Brasil e o mundo. A Advocacia tem trazido teses jurídicas interessantes para análise dos Tribunais, com viés mais humano, fraterno e solidário, nunca antes visto em nosso legado profissional.

As tensões existentes entre o trabalho e o capital, o abismo social e a responsabilidade dos agentes públicos frente à pandemia têm exigido diuturnamente do profissional do direito estudo continuo, de modo a ser o algodão entre os cristais. A Advocacia exerce importante papel na pacificação social e mediação de conflitos e, com a pandemia vivenciada não será diferente. Os impactos que o coronavírus trouxeram para a economia e as relações humanas ainda são incertos e desconhecidos, mas certo será o papel da Advocacia neste contexto emergencial.

Yuval Noah Harari já alertava em sua obra Homo Deus que “quando chega o momento de optar entre o crescimento econômico e estabilidade ecológica, políticos, executivos e eleitores sempre preferem o crescimento. No século XXI, teremos de fazer melhor do que isso se quisermos evitar a catástrofe”. A cada dia um novo decreto, uma nova resolução, uma portaria a regular condutas e procedimentos. O que hoje vige, amanhã pode já não ter mais valia[4]. Mais uma vez, um novo momento de provocação, a escolher entre o crescimento econômico ou o isolamento social momentâneo em prol de vidas.

O direito à locomoção, ao lazer, ao culto religioso, às férias, à propriedade privada dentre outros direitos tem sido relativizado, mesmo que momentaneamente, quase que sofrendo uma espécie de mutação genética em nosso arcabouço jurídico, para dar espaço à segurança e à saúde pública efetiva da população. Pelo Isolamento social proposto busca-se atrair um menor contágio da população em tempos de epidemia de covid19. Neste sentido, Michael J. Sandel, professor da Universidade de Harvard, questiona os princípios contemporâneos de justiça, sugerindo o raciocínio moral consequencial do qual resulta o princípio “melhor sacrificar uma vida para que cinco possam sobreviver”[5].

Tais reflexões atuais não se operam apenas no segmento filosófico; no ramo do Direito Administrativo, por exemplo, ferramentas estão disponíveis aos gestores públicos para o enfrentamento da pandemia: desapropriação por necessidade pública (art. 5º, XXIV, da CF e DL 3.365/1941), requisição de bens (art. 5º, XXV, da CF), contratação temporária de servidores (art. 37, IX da CF), contratação direta com dispensa de licitação (art. 24, III e IV da Lei 8.666/93) dentre outras medidas de emergência a serem tomadas em função do surto do coronavírus (Lei 13.979/20).

Também, no Direito do Trabalho, a Medida Provisória 927/20 trouxe especificações contingenciais na relação de trabalho, como a adoção do teletrabalho, do home office, a possibilidade de compensação das horas-extras, a suspensão contratual ou redução do salário durante o período do afastamento decorrente da pandemia pactuado em acordo ou convenção coletiva com o sindicato da categoria, a concessão de férias coletivas ou antecipação de férias individuais, o aproveitamento e antecipação de feriados, o banco de horas, a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde do trabalho, o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia e Tempo de Serviço (FGTS), a contaminação de empregado, os Acordos e Convenções coletivas vencidos ou vincendos, a fiscalização do Ministério da Economia, a falta justificada e licença remunerada, o trabalhador suspeito de contaminação, o meio ambiente do trabalho, a rescisão, por exemplo.

Já no Direito Aeronáutico medidas emergenciais foram adotadas para a aviação comercial na tentativa de amenizar os impactos e a proliferação da covid19, por meio da MP 925/20.

A suspensão dos prazos processuais pelos Tribunais pátrios diante da Resolução nº 313/20, do Conselho Nacional de Justiça, a restrição ao atendimento público, a facilitação do fluxo do comércio exterior dos produtos utilizados no combate ao vírus (Resolução CAMEX nº 17/20 e Portaria SECEX nº 16/20) dentre outras tantas medidas criadas para o enfretamento visam amenizar os impactos.

Entretanto a Advocacia precisa estar em pé e à ordem, vigilante, para que afrontas à Constituição Brasileira e às leis vigentes não ocorram sob o discurso transvestido de combate à pandemia atual[6], nem permitir que discussões político-partidárias tragam pânico e temor à população já fragilizada e carente. Por ora urge a união partidária pro societate. Unamo-nos, todos, em prol do bem-estar da população, em especial o grupo de risco (idosos, diabéticos e doentes cardíacos), e perpetuação segura de nossa espécie.

A qualquer tempo, a Advocacia está presente, e em permanente defesa da Sociedade.

 

[1] Homo Deus: Uma Breve História do Amanhã é um livro escrito pelo autor israelense Yuval Harari, professor da Universidade Hebraica de Jerusalém, em Jerusalém, Israel, Companhia das Letras.

[2] Uma pandemia (do grego παν [pan = tudo/ todo(s)] + δήμος [demos = povo]) é uma epidemia de doença infecciosa que se espalha entre a população localizada numa grande região geográfica como, por exemplo, um continente, ou mesmo o Planeta Terra. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Pandemia, acessado em 27/03/2020.

[3] Vide as grandes epidemias ao longo da história em https://super.abril.com.br/saude/as-grandes-epidemias-ao-longo-da-historia/, acessado em 25/03/2020.

[4] Vide as atualizações diárias na legislação no site: http://www4.planalto.gov.br/legislacao/portal-legis/legislacao-covid-19, acessado em 28/03/2020.

[5] Vide a obra de Sandel: Justiça: o que é fazer a coisa certa. Civilização Brasileira, 2011.

[6] O contágio por meio das vias respiratórias, por gotículas de saliva e espirros, propaga-se rapidamente pelo país. Por sofrer mutação com frequência, o vírus dificulta a elaboração de uma vacina rápida e eficaz.

*O presidente do Instituto dos Advogados de Santa Catarina IASC e vice-presidente do Colégio de Presidentes dos Institutos dos Advogados do Brasil, advogado e professor, Gilberto Lopes Teixeira, em texto atual e reflexivo sobre A Advocacia em tempos de pandemia. Leia o inteiro teor na página de entrada do http://www.conversandocomoprofessor.com.br/

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