Inteligência Artificial e Advocacia: A Urgência de um Novo Paradigma.
Por: Pedro Pìrajá – Membro Efetivo do IASC
A inteligência artificial (IA) está para o século XXI assim como a internet esteve para as décadas de 1990 e 2000. Sua presença transforma mercados, profissões e interações sociais. Na advocacia, esse impacto é inevitável: os profissionais que não se adaptarem às novas tecnologias enfrentarão dificuldades em um ambiente cada vez mais competitivo e tecnológico. Contudo, a relação da advocacia brasileira com a tecnologia ainda é marcada por resistência e medo – medo de ser substituído, de cometer erros ou de lidar com um código de ética desatualizado, promulgado no século passado.
Diante desse cenário, é essencial que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) assuma um papel ativo na transição digital da profissão. Um primeiro passo seria a realização de uma pesquisa marco zero para mapear a utilização da IA entre advogados e escritórios de advocacia. Essa iniciativa permitiria identificar o nível atual de adoção, as dificuldades enfrentadas e as oportunidades percebidas pelos profissionais. Com esses dados, a OAB poderia estruturar políticas e iniciativas voltadas à capacitação e à atualização regulatória.
Reflexões como as do historiador Yuval Noah Harari, trazidas por Daniel Marques, presidente da Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs (AB2L), reforçam os riscos éticos da IA, como a manipulação de decisões e a concentração de poder em poucas mãos. Daniel, à frente da AB2L, que congrega a maioria das startups legaltechs do Brasil, destaca a necessidade de conduzir essa pesquisa para compreender melhor os desafios e oportunidades da IA na advocacia. Ele também defende a criação de um polo de inovação jurídica, permitindo que advogados e startups experimentem novas tecnologias em um ambiente controlado, onde erros e acertos sejam vistos como parte natural do processo de inovação aberta.
Paralelamente, a capacitação dos advogados é indispensável. Iniciativas educacionais focadas em práticas tecnológicas, que integram ética e inovação, já têm demonstrado resultados positivos. Cursos que abordam o uso de ferramentas de automação, análise de dados e inteligência artificial são exemplos de como os profissionais podem se preparar para enfrentar os desafios e oportunidades do futuro. Nesse contexto, a advocacia precisa abandonar o medo e enxergar a tecnologia como um meio de potencializar sua atuação, expandir possibilidades e oferecer soluções mais ágeis e precisas aos clientes.
A jovem advocacia, em sua maioria nativa digital, surge como um contraponto às gerações X e Y, que ainda estão no mercado e precisam se adaptar à nova realidade tecnológica. Os jovens advogados já estão habituados a um mundo digital, onde a conectividade e a automação são naturais, enquanto muitos profissionais estabelecidos enfrentam a barreira da adaptação. Para essa nova geração, estruturas físicas enormes e a escassez de plataformas digitais não são aceitáveis; eles demandam uma OAB mais conectada, ágil e capaz de atender suas expectativas. É imperativo que a instituição modernize suas operações, adotando soluções digitais que não apenas facilitem o acesso aos seus serviços, mas também fortaleçam sua relação com essa nova advocacia.
Além disso, a OAB deve rever seu papel como agente de transformação digital. Isso inclui a atualização do Código de Ética e do Estatuto da Advocacia, de modo a oferecer diretrizes claras sobre o uso de tecnologias no exercício profissional. Transformações institucionais, como a promoção de uma cultura de inovação e a criação de regulamentações específicas para o uso da IA, são passos fundamentais para alinhar a advocacia às demandas contemporâneas.
Assim como a internet se tornou a espinha dorsal do mundo moderno, a inteligência artificial está se consolidando como a próxima grande revolução. É papel da OAB liderar essa transição, garantindo que a advocacia brasileira não apenas acompanhe, mas protagonize essa transformação. A adoção da IA, se conduzida de forma ética e responsável, pode elevar a advocacia a um novo patamar, no qual a tecnologia serve para fortalecer, e não substituir, o papel humano.
Somente com visão de futuro e ações concretas será possível construir uma advocacia moderna, inovadora e preparada para os desafios do século XXI. A OAB precisa assumir a vanguarda desse movimento, não apenas para garantir a relevância da profissão, mas para atender às expectativas de um público que não aceita mais operar com paradigmas do passado.