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Tráfico de pessoas e a violência contra a mulher

Por Tammy Fortunato – Presidente da Comissão  de Combate às Violências Contra a Mulher.

A violência contra a mulher está presente em várias vertentes, desde o âmbito privado, quando há incidência da violência doméstica, até o âmbito público, quando tratamos dos mais diversos tipos de violências cometidas contra as mulheres em razão do gênero.

Uma das modalidades de violência perpetradas contra mulheres e crianças[1], no âmbito público, é o tráfico de pessoas. Segundo relatório elaborado pelo Governo dos Estados Unidos[2], o tráfico de pessoas faz, atualmente, 24,9 milhões de vítimas, sendo este considerado um dos crimes mais hediondos.

Mulheres e crianças são recrutadas por traficantes de pessoas que podem ser desde um parente, amigo, empregador, até um traficante profissional, cujo cunho exploratório, na maioria das vezes, é a prática sexual[3]. Há, também, o recrutamento delas para trabalhos forçados análogos ao escravo, remoção de órgãos, entre outras práticas, porém em menor proporção.

A legislação[4] que prevê a prevenção, repressão e punição, apresenta destaque quando as vítimas de tráfico humano são mulheres e crianças.

Segundo estudos[5], um terço das vítimas do tráfico de pessoas são jovens e crianças, um número bastante elevado e preocupante.

O tráfico de pessoas tem seu conceito disposto no Protocolo de Palermo, ratificado pelo Brasil através do Decreto nº 5.017/04, que trata em seu artigo 3º, a):

“A expressão “tráfico de pessoas” significa o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos”.

Pessoas são recrutadas com o objetivo de exploração do trabalho, remoção de órgãos e, exploração da prostituição, sendo esta última a principal violência sofrida por mulheres e crianças. Para todas as modalidades do tráfico de pessoas, o objetivo é um só: a exploração do ser humano, visto apenas como um objeto.

A objetificação do corpo feminino torna tal gênero o preferido dos traficantes para exploração sexual. A prostituição é amplamente explorada, chegando ao ponto de tais mulheres e crianças serem consideradas escravas sexuais.

A violência sofrida por tais mulheres deve ser amplamente combatida. A Convenção Interamericana de Belém do Pará garante a todas as mulheres o livre exercício dos direitos humanos e uma vida livre de violências.

A violência sexual sofrida por mulheres e crianças é devastadora, além de outras espécies, tais como: psicológica, material e física, além daquela decorrente do tráfico humano.

O enfrentamento ao tráfico de pessoas, principalmente o tráfico de mulheres e crianças, é pouco difundido no Brasil e, ainda, há pouco conhecimento sobre este tipo de violência. Observa-se que o tráfico de pessoas tem ocorrência multinacional, presente na esfera mundial, cabendo a todos os Estados-Parte o enfrentamento a tal violência.

O tráfico de pessoas abrange todas as classes sociais, estando presente na área rural e na cidade. O Brasil é considerado tanto um grande importador quanto exportador de pessoas. No entanto, a Organização Internacional do Trabalho – OIT[6] estima que 77% das vítimas do tráfico de pessoas são exploradas dentro do seu próprio país de origem, o chamado tráfico nacional[7].

O tráfico de pessoas não conhece limites, divisas e fronteiras, apresentando-se nos mais diversos locais.

Os direitos fundamentais inerentes à pessoa são violados, sendo-lhes tolhidos seus direitos fundamentais[8], tais como a dignidade[9], a liberdade, e, por vezes, até mesmo a vida, embora a ideia principal do tráfico de pessoas seja a exploração econômica.

Há uma grave violação dos direitos humanos todas às vezes em que há a ocorrência de tráfico humano, ocorrendo um verdadeiro crime contra a humanidade, que precisa ser amplamente combatido.

Ocorre que muitas vítimas do tráfico de pessoas deixam de procurar ajuda e, como consequência, também acabam não denunciando o traficante, por não se verem como vítimas, mas como coparticipes, o que acaba fortalecendo o trabalho do recrutador/traficante, que conta com a certeza da impunidade.

Outro motivo para que não haja denúncia é a vergonha e, principalmente, o medo que vítima tem, além da falta de informação, inclusive sobre locais para procurar ajuda. Traficantes ameaçam não só a vítima, mas sua família também. Muitas vezes as vítimas estão livres, sem amarras físicas, mas estão presas a chantagens e ameaças, ou seja, a uma amarra psicológica.

As vítimas do tráfico de pessoas, principalmente mulheres e crianças, têm que se sentir acolhidas ao procurar ajuda, mas jamais julgadas.

É preciso impedir os traficantes de recrutarem novas vítimas, sendo dever dos Estados-Parte a proteção e o combate ao sistema do tráfico de pessoas.

O dia 30 de julho, simbolizado por um coração azul[10], é o dia nacional e mundial do árduo trabalho de enfrentamento ao tráfico de pessoas. É preciso ficar atento e ajudar a combater este tipo de violência. É preciso falar sobre o tráfico de pessoas.

[1] Decreto nº 5.017/04, artigo 3º, alínea d: “O termo “criança” significa qualquer pessoa com idade inferior a dezoito anos”. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2004/Decreto/D5017.htm

[2] Disponível em: https://www.state.gov/reports/2019-trafficking-in-persons-report/

[3] Percentuais de mulheres adultas vítimas de tráfico de pessoas:49%; crianças do sexo feminino 23%, homens adultos 21%; crianças do sexo masculino 7%. Fonte: UNODC. Disponível em: https://www.unodc.org/documents/lpo-brazil//Topics_TIP/Publicacoes/TiP_PT.pdf

[4] Lei 5.017/04. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2004/Decreto/D5017.htm

[5] https://www.unodc.org/lpo-brazil/pt/frontpage/2018/07/unodc-marca-o-dia-mundial-contra-o-trfico-de-pessoas–e-apela-para-a-melhor-proteo-de-crianas-e-os-jovens.html#:~:text=30%20de%20julho%20de%202018&text=No%20Dia%20Mundial%20contra%20o%20Tr%C3%A1fico%20de%20Pessoas%2C%20a%20Organiza%C3%A7%C3%A3o,formas%20e%20n%C3%A3o%20conhece%20fronteiras.

[6] Disponível em: https://www.state.gov/wp-content/uploads/2019/06/2019-Trafficking-in-Persons-Report.pdf

[7] Segundo a United Nacions Office on Drugs and Crimes – UNODC: “A maioria das vítimas de tráfico é detectada em seus países de cidadania. A identificação de vítimas nacionais aumentou nos últimos 15 anos”. Disponível em: https://www.unodc.org/documents/lpo-brazil//Topics_TIP/Publicacoes/TiP_PT.pdf

[8] Os direitos individuais e coletivos previstos na Constituição Federal, estão elencados no artigo 5º. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

[9] O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana está previsto na Constituição Federal, no artigo 1º, III.

[10] “(…)o Coração Azul, que representa a tristeza das vítimas deste tipo de crime e lembra a insensibilidade daqueles que compram e vendem seres humanos. O uso da cor azul também demonstra o compromisso da ONU com o combate ao tráfico de pessoas”. https://nacoesunidas.org/campanha/coracao-azul/

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