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Os Condomínios devem se adequar às disposições da LGPD?

Por Marina Zipser Granzotto – Diretora Tesoureira do IASC*

Quem nunca percebeu que, logo após navegar na internet procurando por produtos ou serviços passou a receber, quase que instantaneamente, propagandas e ofertas com objetos similares em suas redes sociais e e-mails?

Coincidência? Não, claro que não.

Se o que acaba de ser descrito já aconteceu com você, não se engane, os seus dados, informações e o seu perfil de consumidor já foram, há muito, compartilhados — ou comercializados –, com ou sem o seu conhecimento, contando ou não com a sua anuência.

E é por isso que de um tempo para cá a maciça maioria dos sites que instalam cookies e captam informações de navegação apresentam, já no primeiro acesso, uma notificação para o seu aceite ou conhecimento. E notem, praticamente não se consegue seguir acessando a página sem externar o tal do ‘aceite’.

A bem da verdade é que diante do crescente processo de globalização, a humanidade rapidamente se conectou ao chamado mundo digital e virtual, desfrutando das facilidades que lhes são próprias, elegendo o denominado e-commerce como uma ferramenta de praticidade, mas de carona surgiram os riscos, os desconfortos e as violações a direitos.

O mundo passou a ser desafiado mais do que nunca a adotar providências rígidas, com o fim de coibir o abuso nessas relações e a regulamentar o direito digital e os seus desdobramentos.

Inspirada principalmente na General Data Protection Regulation (GDPR), com aplicação em toda a União Europeia, o Brasil editou a Lei n.º 13.709/2018, conhecida como Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – LGPD, com o fim de regulamentar, já no seu artigo 1º, o

“(…) tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural”.

Embora datada de 2018, suas disposições só passaram a vigorar em 18 de setembro de 2020, a partir da sanção da Lei n.º 14.058/2020, originada da Medida Provisória (MP) 959/2020, em meio à pandemia decorrente do COVID-19, impactando sobremaneira as pessoas jurídicas nos âmbitos público e privado, assim como as pessoas naturais, especialmente do ponto de vista de que é necessário se ter muito cuidado e respeito ao captar, armazenar, utilizar e cuidar de dados e informações das pessoas naturais, com mais ênfase aos denominados dados pessoais sensíveis.

As dúvidas que gravitam em torno do assunto e da interpretação das disposições da LGPD ainda são muitas, mas os cuidados com os dados das pessoas naturais — que compilados se transformam em informações –, é uma realidade que certamente não terá mais volta, ainda que a lei sofra alguma modificação ou adequação.

Só para constar, a LGPD sequer diferencia se a obrigação de proteger os dados compete a grandes ou pequenas empresas, e a conclusão lógica é que todos que lidam com dados ou informações precisam se adequar.

Em caso de descumprimento, as sanções vão desde uma advertência, com fixação de prazo para adoção de medidas corretivas, até aplicação de multas por infração, multas diárias, bloqueio, suspensão e eliminação de bancos de dados e publicização de infrações.

As consideradas multas simples (bastante salgadas e indigestas), deverão ser fixadas em até 2% do faturamento da pessoa jurídica no seu último exercício, excluídos os tributos e limitadas a R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais), por infração.

Segundo a Lei n.º 14.010, de 12 de junho de 2020, a previsão é que as referidas sanções sejam aplicáveis já a partir de 1º de agosto de 2021.

A Constituição Federal de 1988 já consagrou em seu bojo direitos fundamentais, assegurando ao cidadão a inviolabilidade de dados e a autodeterminação informativa (art. 5º, incisos X, XI, XII e LXXII), e a lei ordinária veio para especificar como se dá tal proteção de dados pessoais.

O que vários síndicos têm me perguntado é se precisam adotar alguma providência por conta da LGPD.

As dúvidas são pertinentes e a resposta à pergunta é sim!

Saiba que embora o assunto aparentemente ainda não tenha ganhado muita notoriedade em relação a condomínios — mesmo porque a lei está direcionada com mais ênfase às pessoas jurídicas que exerçam atividades comerciais –, as disposições protetivas e de cuidados com dados lhes alcançam.

O impacto mais imediato a ser sentido nos condomínios será na revisão completa das práticas do dia a dia, especialmente na maneira como coleta, guarda, utiliza, disponibiliza e compartilha com terceiros quaisquer dados pessoais dos seus condôminos ou moradores.

Ter um cadastro dos moradores e condôminos é importante, desde nome completo, CPF, endereço eletrônico, e agora a proteção dessas informações e dados é igualmente fundamental.

A atualização da redação das convenções de condomínio e regimento interno, na maioria das vezes, é imprescindível, até mesmo para formalizar e nortear os procedimentos a serem observados no cuidado com os dados e informações pessoais na relação condominial entre os moradores, empregados, colaboradores, terceirizados, prestadores de serviços, visitantes, portaria remota, captação de imagens, estabelecendo quem pode ter acesso ao que, deixando claro quais as reprimendas em caso de violação.

Além disso, todas as relações administrativas merecem ser revistas do ponto de vista jurídico, adequando a redação desde o contrato com a contabilidade, passando pelo de vigilância patrimonial, sistema de segurança eletrônico, portaria remota, contratos de trabalho, e todos os demais que vierem a ser formalizados, porque em todas estas relações há o compartilhamento de dados e informações, e o objetivo primeiro da lei é coibir a sua disseminação com fins outros que não os contratados.

Será preciso treinamento, paciência, deixar a zona de conforto, inovar, investir em tecnologia, ter criatividade, sempre tendo em vista o norte que se extrai da máxima ‘fora da organização não há solução’.

Existem condomínios cujo dia a dia em muito se assemelha ao trânsito caótico da Índia, uma verdadeira loucura! E ainda estou à procura de um que se assemelhe mais a um templo budista…

Brincadeiras à parte, o fato é que os condomínios, mesmo em tempos de pandemia e de crise, haverão de formar caixa, porque certamente será necessário investir em assessoria tecnológica e de segurança de informação, assim como elaborar política de privacidade e adequação jurídica dos documentos que regem a vida condominial.

Além de ser um trabalho eminentemente técnico, demorado, minucioso e composto de várias etapas, não se pode esquecer que para alterar a convenção de condomínio a lei exige o quórum de 2/3 para alcançar a sua validação.

E como a responsabilidade do síndico é grande, chegando a responder com o seu patrimônio pessoal para reparar os danos causados aos moradores ou a terceiros, nos casos que tenha deixado de observar obrigações que lhe eram devidas (art. 1348 do CC), não há tempo a perder.

Então fica o recado aos síndicos, é preciso cuidado, porque o dever assumido exige.

E bem por isso faz sentido relembrar uma das regrais gerais do Direito, de que “Dormientibus Non Sucurrit Ius”, segundo a qual “o Direito não socorre aos que dormem”.

E aí, o seu Condomínio já está enfrentando o assunto?

* Marina Zipser Granzotto é advogada trabalhista e condominial e Diretora Tesoureira do Instituto dos Advogados de Santa Catarina – IASC.

 

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